Gelo quebrado e boa vontade em Brasília
por Ribamar Corrêa
A incursão do governador Flávio Dino (PCdoB) em Brasília mandou para o
cesto a impressão, reforçada por ataques de adversários, de que ele
estaria amargando a condição de pária aos olhos do Palácio do Planalto e
de todos os segmentos do governo da presidente Dilma Rousseff. O
governador foi recebido pela presidente – conversaram por longo tempo – e
pelos ministros Aloísio Mercadante (Casa Civil), Cid Gomes (Educação) e
José Eduardo Cardozo (Justiça) e pelo secretário executivo do
Ministério da Integração, Carlos Vieira, se não com trombetas festivas,
com boa vontade suficiente para avaliar que a viagem foi bem sucedida. A
eles apresentou e entregou projetos, propostas e reivindicações, fez
relatos de como encontrou o Maranhão e as medidas que adotou até agora
para assumir o controle nas áreas específicas de cada pasta, e trocou
informações e impressões acerca do cenário nacional.
Havia no meio político do Maranhão, até mesmo em alguns segmentos do
governo, a suspeita de que Flávio Dino estaria “queimado” na cúpula do
PT e do Governo Federal. Alguns mais apressados chegaram a afirmar que a
presidente Dilma não queria conversa com o governador do Maranhão,
tendo inclusive mandado avisá-lo de que, pelo menos por enquanto, seria
ele persona non grata em territórios do Governo Federal. A
oposição chegou mesmo a espalhar o boato segundo o qual o governador
poderia até mesmo cerrar fileira com o PSDB e o DEM e colocar o seu peso
politico contra o Palácio do Planalto. Mas nada disso se confirmou.
Muito ao contrário. Dino estava apenas aguardando o momento mais
adequado para desembarcar em Brasília.
Três fatos contribuíram decisivamente para a criação dessa atmosfera
desfavorável ao governador do Maranhão em relação à presidente da
República. O primeiro foi a aliança de Dino, candidato a governador pelo
PCdoB, partido linha de frente da candidatura presidencial à reeleição,
com os presidenciáveis Aécio Neves (PSDB), de um lado, e Eduardo Campos
(PSB), de outro. A segunda foi a não ida de Flávio Dino à posse da
presidente em Brasília, preferindo permanecer em São Luís para
protagonizar a sua própria festa de posse. E, finalmente, a não ida do
governador a Brasília nos primeiros momentos do governo, andando na
contramão até de governadores de oposição. Os três fatos, amplificados
por vozes oposicionistas como sintomas de uma suposta rejeição
presidencial, foram interpretados com preocupação por apoiadores,
adversários responsáveis e independentes como prenúncio de que de que o
caminho do governador até o Planalto seria longo, pedregoso e
traumático.
O clima de distanciamento do governador em relação a Brasília
permaneceu durante os primeiros 40 dias do novo governo, mas começou a
ser revertido na última semana, com sinais, cada vez mais claros, de que
de que o passo decisivo para a quebra do gelo fosse dado pelo
governador do Maranhão. A viagem à Capital do país confirmou a
expectativa de que fora criada quando a agenda começou a circular.
O governador Flávio Dino não chegou a Brasília de cabeça baixa e com o
pires na mão. Chegou como quem tem cartas importantes e decisivas no
bolso do colete para ser tratado de maneira decente. Para começar, não
rejeitou a candidatura da presidente Dilma durante a campanha, ao
contrário, declarou-lhe apoio aberto, causando, em alguns momentos,
irritação nos seus aliados tucanos e socialistas. Enfrentou, por isso,
uma pesada artilharia de adversários, que o acusaram de fazer jogo
triplo e fizeram de tudo para incompatibilizá-lo com a
presidente-candidata. Ele tinha poder de fogo eleitoral suficiente para
dispensar Aécio Neves e Eduardo Campos, mas preferiu manter o apoio
furta-cor ao tucano, apostando que teria condições de vencer as
restrições da presidente Dilma no porvir. O resultado apertado da
eleição presidencial demonstrou que sua estratégia de não hostilizar
Aécio Neves estava certa. A mesma situação valia para Eduardo Campos,
com a vantagem de que o ex-governador de Pernambuco fora aliado de
primeira hora do governo só dele se afastando quando não foi escolhido
candidato da aliança PT/PMDB/PSB e companhia.
O desfecho das eleições mostrou duas situações: a presidente Dilma e o
comando do PT torceram o nariz para o governador eleito do Maranhão,
que, por sua vez, saiu das urnas com 63,5% dos votos, proporcionalmente o
maior cacife do país, e no comando de uma base parlamentar formada por
um senador e nove deputados federais. Esse poder de fogo relativamente
grande é reforçado pelas obrigações que a presidente Dilma tem para com o
Maranhão, que lhe deu 69,5% dos seus votos, o segundo maior percentual
do país.
O mal-estar pós-eleitoral e os maremotos petrolíferos – que ameaçam
se transformar em tsunamis – que ameaçam o Palácio do Planalto colocam o
governo do PT em estado de alerta. Flávio Dino desembarcou em Brasília
no momento em que a presidente Dilma se encontra numa trincheira
defensiva – corrupção na Petrobras, zumzum sobre impeachment, inflação
alta e insatisfação geral no país -, carecendo de apoio político,
institucional e, principalmente, parlamentar, para enfrentar o vendaval
que ameaça seu governo e até mesmo seu mandato, não podendo se dar ao
luxo de esnobar aliados. A receptividade dos ministros, a começar pelo
chefe da Casa Civil, demonstra que o governador do Maranhão é um aliado a
ser afagado, pelos mais diversos motivos.
Por outro lado, não se diga que o governador se movimentou para
aproveitar esse momento de fragilidade da presidente e do governo dela.
Mas não há como não avaliar que tal situação o favorece e facilita o
diálogo do Palácio dos Leões com o Palácio do Planalto, principalmente
num momento em que um precisa muito do outro.