'Acho difícil que Dilma se torne refém do Congresso Nacional', diz ex-marido da presidente
Para advogado e conselheiro informal da ex-mulher, liderança de Eduardo Cunha é 'frágil'
O Globo
Ex-marido e conselheiro “informal” da presidente Dilma Rousseff, o advogado Carlos Araújo avalia que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, pode causar estragos pontuais, mas que a liderança que exerce é frágil.
O GLOBO: Nas conversas com a presidente, transparece alguma preocupação dela com a postura do Congresso?
CARLOS ARAÚJO: Não. Acho muito difícil, inclusive, que a Dilma e, por extensão, o governo se tornem reféns do Congresso, embora com esse Congresso, dominado pelo Eduardo Cunha, qualquer coisa possa acontecer. O confronto, me parece, está aberto, mas Cunha não vai conseguir contentar a todos os seus aliados permanentemente. Então, já começaram as divisões na base oposicionista, contradições estão aflorando. A liderança de Cunha, apesar de aparentemente forte, é frágil.
Mas o governo sofreu derrotas importantes. Isso não preocupa?
Para algumas questões esse grupo pode ter unidade, mas para outras, diria as principais, não. Não consegue ser politicamente hegemônico porque os interesses são muito diversificados. Veja a reforma política que não houve. É um exemplo das contradições e desconfianças que começam a surgir. Lideranças do PSDB já estão se posicionando, publicamente, em tom crítico. O argumento do partido é simples: nós criamos a reeleição e agora, sem mais nem menos, votamos contra? Não dá.
A hostilidade de Eduardo Cunha não pode ser prejudicial à condução do governo?
O Eduardo Cunha pode fazer seus estragos sim, mas só no âmbito do Congresso. O que vai fazer além disso? O problema, que começa a ser amplamente percebido é que não se pode viver de coisas pontuais, não se pode mudar as normas do país, a Constituição, de dois em dois anos. Algumas vozes do PSDB, volto a salientar, estão dizendo que não é possível mudar o discurso do partido conforme a música. O PSDB criou o fator previdenciário. Agora vai lá e vota para acabar com o fator previdenciário. E amanhã ou depois, faz o que caso volte a ser governo? O (Arnaldo) Madeira e o (vice-presidente do partido Alberto) Goldman estão pedindo coerência ao partido.
Com um Congresso tão pragmático, há risco de crise institucional?
Sempre que leio sobre essas coisas esdrúxulas que ocorrem no Congresso, me lembro do Ulysses Guimarães. Dizia ele: a pior legislatura é sempre a que está por vir. E a realidade, infelizmente, tem sido essa. Mas não temo uma crise institucional porque a oposição séria já começa a ver que não dá para ficar confortável ali dentro.
A presidente alguma vez acreditou que a tese do impeachment pudesse prosperar?
Nunca acreditou. Ela sabe que faz parte do jogo político e não sentiu nenhuma mágoa pessoal com isso. Quem passou pelo que ela passou, e chega a presidente da República, sabe que na política a coisa é pesada. Não pode sucumbir.
Mesmo que ainda haja pedidos de investigação em aberto?
Eu acho que houve um certo voluntarismo dos conservadores nesse episódio de impeachment para reverter a derrota de 2014, como se diz, no tapetão. Por isso, o movimento foi um pouco anárquico no início, até porque um dos líderes era o (músico) Lobão! Então, essa coisa que, no início, teve uma certa empolgação, tende agora a desaparecer, não tem mais eco político ou social. Não dá voto, não decide eleição. Nesse sentido, acho que uma liderança como o (senador) Aécio Neves cometeu um equívoco em aderir incondicionalmente à tese. Tanto que, depois, foi advertido por lideranças do PSDB, notadamente o (ex-presidente) Fernando Henrique, de que o caminho não era esse.
A situação econômica do país continua muito vulnerável. Isso não pode motivar a retomada da agenda anti-Dilma?
Claro, há inflação, cortes na educação, em outras políticas sociais, mas são cortes temporários e não tão expressivos assim. Não são estruturais. Isso de que acusam a Dilma e o governo, de terem feito uma política contra os trabalhadores devido às restrições no seguro-desemprego e nas pensões para viúvas, não se sustenta. A gente sabe que a fraude é imensa no seguro-desemprego. Sou advogado trabalhista, sei como funciona. Precisava mexer mesmo. Nas pensões, a mesma coisa.
O ajuste era inevitável?
Sim. Quem ganhasse a eleição teria de fazê-lo, com mais ou menos arrojo, com doses diferentes, mas teria de fazer.
Então a tese de estelionato eleitoral é correta?
Não diria isso. É que o governo tomou consciência da gravidade da situação durante a campanha eleitoral. E aí, no meio da eleição, não tem como mudar a política econômica. E nem dá para falar em crise, sendo governo, durante uma campanha eleitoral. Então, eu vejo que se tratou de preparar o país para, logo depois da eleição, adotar uma política para sair da crise.
Como o senhor analisa o cenário eleitoral para 2018?
Tenho a mais absoluta certeza de que o Aécio sabe que não será candidato. Na minha opinião, o (governador de São Paulo, Geraldo) Alckmin será o escolhido do campo oposicionista. Não dá para excluir o (senador José) Serra, pelo seu passado, pela experiência, mas acredito que o embate será mesmo com o Alckmin. É um candidato forte e pratica uma política mais inteligente. Ele, por exemplo, não quer confronto com o governo federal agora. Precisa se beneficiar dos recursos do governo até onde der. O dilema do PSDB é como se ver livre do Aécio, como candidato, claro, sem que ele fique muito magoado.
E no outro campo?
O confronto vai ser com o Lula. Mesmo com o desgaste profundo do PT e do governo. É claro que o Lula tem todo esse fardo, o mensalão, se sabia ou não, se ordenou ou se não ordenou. O país também vive uma crise econômica. Ele tem dito internamente que se o governo melhorar ele vai para a disputa. Ou seja, está condicionando. Mas acredito que será candidato de qualquer forma.