sexta-feira, 27 de maio de 2016

"A ditadura da Justiça tá implantada, é a pior de todas", diz José Sarney em nova gravação 


Marcos Losekann / Heloísa Torres
Jornal da Globo
Brasília, DF

Em mais um áudio da série gravada pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, agora delator premiado da Operação Lava Jato, o ex-presidente da República José Sarney reclama do que considera uma "ditadura da Justiça". Com aliados como Sérgio Machado, o PMDB não precisa de inimigos, como explica o repórter Marcos Losekann, direto de Brasília.

De fato, o ex-senador e ex-presidente da Transpetro, acusado de desviar dinheiro da Petrobras para o bolso de políticos, se transformou em uma pedra no sapato de muita gente graúda na política. Sobretudo parte da cúpula do PMDB, de quem o Sérgio Machado foi de melhor amigo a maior traidor.

Isso aconteceu depois que ele montou um esquema para gravar a conversa dele com alguns dos caciques do PMDB, atraindo os interlocutores para uma conversa pra lá de comprometedora.

Mais um capítulo da crise política que parece não ter fim, crise que esquentou ainda mais alguns graus, com a revelação de novos trechos dessas conversas capciosamente indiscretas. Nesses diálogos, a tentativa de livrar políticos da Lava Jato. Confira todos os detalhes no vídeo com a reportagem de Heloísa Torres.

Sérgio Machado vem tirando o sossego de políticos. Com um gravador escondido, registrou articulações para tentar barrar as investigações. Isso em reuniões em Brasília, na casa do presidente do Senado, Renan Calheiros, e na casa do ex-presidente da República José Sarney.

Machado foi senador e presidente da Transpetro, que contratou empresas que, por sua vez, apoiaram o PMDB com dinheiro. Ele disse que foi atrás da cúpula do partido porque tinha medo de ser preso e do que viria nas próximas delações.

Em um encontro com Renan, investigado na Lava Jato, os dois xingam Rodrigo Janot, o procurador-geral da República.

Machado: Agora esse Janot, Renan, é o maior mau caráter da face da Terra.

Renan: Mau caráter! Mau caráter! E faz tudo que essa força-tarefa (Lava Jato) quer.

Machado: É, ele não manda. E ele é mau caráter. E ele quer sair como herói. E tem que se encontrar uma fórmula de dar um chega pra lá nessa negociação ampla para poder segurar esse pessoal (Lava Jato). Eles estão se achando o dono do mundo.

Renan:Dono do mundo.

Renan Calheiros disse, por meio de nota, que nunca tomou qualquer iniciativa para dificultar a Lava Jato. O presidente do Senado disse ainda que a indicação de Sérgio Machado para a Transpetro foi uma iniciativa da bancada do PMDB e não dele pessoalmente.
Em fevereiro e março deste ano, Sérgio Machado se encontrou com o ex-presidente Sarney e também gravou as conversas.

Machado: Meu presidente, que saudade.

Sarney: Como tá você?

Os dois falam sobre a situação da presidente Dilma Rousseff, que ainda não tinha sido afastada.

Machado: A Dilma não tem condição. Nesse caso do marqueteiro, ela não teve um gesto de solidariedade com o cara. Ela não tem solidariedade com ninguém não, presidente.

Sarney: E, nesse caso, ao que eu sei, é o único que ela tá envolvida diretamente.

A presidente afastada, Dilma Rousseff, disse que todos os pagamentos feitos ao publicitário João Santana foram regulares e contabilizados na prestação de contas apresentadas á Justiça Eleitoral, e que a tentativa de envolver seu nome em situações que nunca participou são escusas e demonstram interesses inconfessáveis

A conversa continua com especulações sobre quem venceria uma eventual eleição. Eles dizem que no final quem vai assumir a presidência será Eduardo Cunha mostrando que os dois não tinham ideia do que estava prestes a ocorrer na política. Cunha caiu antes mesmo de Dilma ser afastada com o processo de impeachment.

Machado: Saindo o Michel e aí como é que fica? Quem assume?

Sarney: Eleição. E vai ter muito, um Joaquim Barbosa desses da vida.

Machado: Ou um Moro... o Aécio pensa que vai ser ele, não vai ser não.

Sarney: Não, não vai ser ele, de jeito nenhum!

Machado: E quem que assume a presidência, se não tem ninguém?

Sarney: O Eduardo Cunha.

Machado: E ele não vai abrir mão de assumir, não.

Sarney: Não... no Supremo não tem. Não tem ninguém que tenha competência para tirá-lo. Só se cassarem o mandato dele. Fora daí não tem. Como é que o Supremo vai tirar o presidente da casa?

Em outro trecho, Sarney e Machado reclamam que Dilma insiste em permanecer no governo diante da crise política e econômica. O ex-presidente Sarney diz que não só empresário e políticos devem pagar pelos mal feitos na Petrobras, mas o governo também.

Sarney :Ela não sai. (...) Resiste...diz que até a última bala. 

Machado: Não tem rabo, não tem nada.

Sarney: Acha que não tem rabo. Tudo isso foi... é o governo, meu Deus! Esse negócio da Petrobras são os empresários que vão pagar, os políticos! E o governo que fez isso tudo?

Machado: Acabou o Lula, presidente.

Sarney: O Lula acabou. O Lula, coitado, ele está em uma depressão tão grande.

Machado: O Lula. E não houve nenhuma solidariedade da parte dela.

A conversa continua. Eles reclamam que ninguém se manifesta contra as decisões de Sérgio Moro. Criticam as decisões da Justiça que estão combatendo a corrupção. Classificam a situação como uma ditadura da Justiça.

Machado: Não teve um jurista que se manifestasse e a mídia está parcial assim. Eu nunca vi uma coisa tão parcial. Gente, eu vivi a revolução (...) não tinha esse terror que tem hoje, não. A ditatura da toga tá f***.

Sarney: A ditadura da Justiça tá implantada, é a pior de todas!

Machado: E eles vão querer tomar o poder. Para poder acabar o trabalho.

O juiz Sérgio Moro não quis se manifestar

O Instituto Lula declarou que quem tem de explicar essas notícias são os que o instituto chama de "beneficiários da aliança entre os partidos golpistas e os setores mais corruptos da política brasileira". O instituto afirma que foram eles que afastaram a dilma rousseff, com o objetivo, segundo o instituto, de controlar as instituições, barrar a operação lava jato e restabelecer a impunidade.

José Sarney também por meio de nota disse que conhece Sérgio Machado há muitos anos. Eles foram colegas no Senado e que sempre tiveram uma relação de amizade e que as conversas que teve com ele foram marcadas pelo sentimento de solidariedade.

Sérgio Machado ainda não é investigado formalmente no Supremo, mas o procurador-geral da República pediu a inclusão do nome dele no principal inquérito da Lava Jato. Ele também foi citado por pelo menos três delatores.

Ele fez a delação premiada para possível redução de pena em caso de condenação. E, agora, com essa nova delação o procurador Rodrigo Janot, pode pedir a abertura de inquéritos, incluir provas nas investigações já abertas ou mandar as citações de pessoas sem foro para o juiz Sérgio Moro, em Curitiba, de quem Sérgio Machado queria se livrar.