"Não vale a pena destruir a democracia por interesse momentâneos", diz Flávio Dino em artigo
"Chegamos
à beira do precipício com uma gravíssima crise política. Recentes ações
atabalhoadas de alguns promotores são sintomas institucionais de
preocupante descontrole geral, em que tudo pode acontecer", diz o
governador do Maranhão.
Por
Flávio Dino
Mudanças impostas à força no Brasil
sempre resultaram em grandes desastres. O exemplo mais recente foi o golpe
civil-militar de 1964, que prendeu, exilou, perseguiu e torturou brasileiros,
sem amparo em regras legais. Ao contrário disso, o Brasil avança quando
maiorias são construídas nos marcos do Estado de Direito, mediante diálogos e
consensos progressivos, sem rasgar regras constitucionais.
Rasgar princípios e regras, a pretexto
de uma luta política momentânea, abre as portas para jogar-nos novamente no
imprevisível. A pretendida solução de um impeachment sem base constitucional
não seria um ponto final, mas o marco zero de um longo ciclo de vinganças,
retaliações e violência política, que arrastaria a economia para uma depressão
ainda maior.
Seria um caso único no presidencialismo
no Planeta: um Chefe do Poder Executivo ser afastado sem ter pessoalmente
cometido qualquer crime no curso do mandato; e afastado sob a liderança de
políticos que, eles sim, respondem a processos criminais. Nem Kafka, nem Marx,
nem Hegel escreveriam um roteiro tão "criativo".
Chegamos à beira do precipício com uma
gravíssima crise política. Recentes ações atabalhoadas de alguns promotores são
sintomas institucionais de preocupante descontrole geral, em que tudo pode
acontecer. Não teremos um "vencedor" nesta guerra. É preciso que
todos os lados envolvidos sentem-se para dialogar tendo à mesa o futuro do
país.
Do lado da oposição, é preciso entender
que, por maior que seja a ânsia de retornar ao poder, o momento marcado na
Constituição para esse debate será outubro de 2018. Do lado do governo, é
preciso apresentar uma agenda clara de retomada do crescimento econômico, que
supere a crise que vivemos com consequências alarmantes para o emprego e
qualidade de vida de milhões de brasileiros. Essas soluções não passam por um
“ajuste fiscal” que consome metade dos recursos da União com pagamento de
juros. É preciso reduzir os juros e retomar programas de crédito direcionado,
como o “Minha Casa Minha Vida”.
Fora do mundo político, é preciso que as
elites econômicas também assumam a responsabilidade sobre o clima de
beligerância criado. Atualmente, a crise só tem servido a bancos, que em meio a
uma queda de 3,8% do PIB viram seus lucros crescer 15% chegando à somatória de
quase R$ 50 bilhões em lucro – apenas considerando as três maiores empresas
privadas do setor. São os seus interesses de manutenção dos juros altos que
levam à crise recessiva. Com a recessão instalada, os bancos defendem que é
preciso aumentar juros para atender ao "mercado", mantendo o círculo
vicioso. Ou seja, querem um Brasil em que somente 1% da população ganha,
passando por cima dos interesses e direitos dos demais 99%.
As grandes empresas de mídia do país
também devem ter consciência do papel decisivo que desempenham neste momento. A
onda de pregações delirantes e boatos sobre intervenção das Forças Armadas
mostram a gravidade do quadro. Não vale a pena destruir a democracia por
interesses momentâneos. Sempre se deve lembrar que o princípio da ação e reação
atua também na história.
Na guerra de todos contra todos,
sobressai o mais forte. E com certeza, no mundo em que vivemos, esse não é o
interesse do cidadão comum. É preciso retomar o diálogo sério para encontrar
soluções aos males que realmente afligem o país, como o subfinanciamento da
saúde pública, os casos de Zika, a crise econômica, o desemprego, a mobilidade
urbana. Toda forma de corrupção deve ser combatida, mas segundo o devido
processo legal, conduzido com serenidade, prudência, sem a paixão pelo
espetáculo.