Em São Luis mulheres articulam luta pelo fim da cultura do estupro
Neste sábado (28), um grupo de mulheres da capital maranhense se organizou em prol da luta contra a banalização do estupro e machismo no Brasil. A plenária ocorreu durante a tarde na ocupação da resistência cultural, no prédio do Iphan, localizado no Centro Histórico de São Luís. Mulheres de vários grupos feministas da cidade se reúniram para dizer não ao machismo e violência sexual contra mulheres.
A ação foi organizada com o objetivo de prestar solidariedade à vítima de um estupro coletivo que ocorreu esta semana no Rio de Janeiro, quando uma jovem de apenas 16 anos foi brutalmente violentada por 33 homens em uma favela. O ato discute temas como protagonismo feminino, cultura do patriarcado, banalização do estupro e culpabilização das vítimas de violência sexual.
As discussões chamam atenção para os dados estatísticos que comprovam a grande quantidade de vítimas de estupro todos os dias no país. Segundo dados do 9º anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a cada 11 minutos uma mulher é vítima de estupro no Brasil. Só no ano de 2014 mais de 46 mil mulheres sofreram violência sexual no país.
Para Carol Fonseca, ativista do movimento feminista e integrante do Coletivo Fridas, a violência contra as mulheres é muito banalizada no Brasil. "Eu acho que quando algo se torna indignação geral, todos os olhos se voltam para aquela situação. As pessoas começam a ver que aquela situação, por mais que seja cotidiana, ela não é normal e com essa reunião de mulheres e essa união feminina para discutir essas temáticas servem para mostrar para a sociedade que não vamos nos calar. A nossa voz é muito importante para combater o machismo e o sexismo e se torna muito mais essencial num momento como esse", diz a ativista.
O evento, também, visou mobilizar e discutir as ações para a manifestação que vai ocorrer nesta sexta-feira (3). De acordo com a organização do evento, o ato com nome "Por todas elas" surgiu nacionalmente e deve ocorrer em todo o país em solidariedade à menina vítima de estupro coletivo.
A reunião contou com a presença de vários grupos feministas de São Luis, como o Coletivo Fridas, Coletivo Catirinas e Coletivo Quebradeiras de Coco. Durante as falas também foi lido o relato da vítima de violência sexual, Helena Ferreira de 16 anos.
Veja o relato na íntegra:
Hoje acordei desejando nunca mais
acordar
O sol brilha lá fora
Mas aqui dentro faz tanto frio.
Me tocaram
Da pior forma que se pode tocar uma
mulher.
Era uma noite de festa
Dança
Paixão
Juventude
Mas tudo se perdeu num copo
Num drink
Num gole.
Meu namorado me dopou
Me drogou.
Lembro das primeiras conversas
Do primeiro beijo
Do primeiro abraço.
Eu pensava que naqueles braços
Eu iria encontrar proteção.
Eu estava enganada.
O crime da noite passada não tem
perdão.
Na minha cabeça as luzes brilhavam
Tudo girava
Escutei vozes
Risadas
DEBOCHE!
Quando acordei estava pelada
Penetrada
Violada
30 bichos em cima de mim
30 monstros
30 bichos papões
30 pesadelos
30 HOMENS.
Eu me senti pequena
Indefesa
Chamava por minha mãe
Mas ninguém me escutava
Ninguém prestava atenção em mim
Eles devoravam meu corpo
Me machucavam cada vez mais
E quanto mais eu chorava
Mais eles gostavam
Meu pai não estava lá pra me defender
Eu queria correr
Fugir para embaixo da minha cama
e me esconder.
APAGUEI.
Acordei jogada num canto
Sem roupa
Sem alma
Sem vida
Apenas DOR.
Uma dor tão forte
Que eu não conseguia nem chorar.
O bicho papão tinha ido embora
O monstro não estava mais ali
A legião de demônios havia
desaparecido
Os homens foram embora.
Mas, eu ainda estava no inferno.
Abraçar minha mãe já não traz alívio
A proteção do meu pai não pode me
salvar mais.
Eu posso me esconder debaixo da cama
Eu posso me esconder em qualquer
lugar
A DOR NÃO VAI PASSAR
NÃO VAI PARAR
NÃO VAI SUMIR.
Minha alma foi estuprada naquela noite
Meu coração foi penetrado
Minha mente está cheia de gozo
Minha boca está com um gosto amargo.
Sei que a vida vai continuar
Eu vou estudar
Trabalhar
Talvez eu volte a sorrir
Meu corpo vai sarar
A ferida vai cicatrizar
Quem sabe eu volte a namorar.
Mas, a minha alma e o meu espírito
Foram levados
Foram roubados
Dilacerados
Viraram cinza.
Quando um homem estupra uma mulher
Ele está estuprando uma menina
Uma moça
Uma mãe
Uma filha
Uma irmã
Uma avó.
Eu clamei por Deus
Clamei por meus pais
Clamei por socorro
Mas os monstros não tem ouvido
Não tem alma
Não tem coração.
Eles estão por toda parte
No ônibus
No metrô
No mercado
Na escola
No trabalho
Dentro de nossa casa.
Mas, quem vai nos salvar?
Eu não sei.
Prazer, meu nome é MULHER
E eu morri aos 16.
Helena Ferreira