Caxiense conta como vive o isolamento domiciliar na Itália
Nádia Santos conta como tem sido a vida em distanciamento social no pais que já foi epicentro da tragédia
Com quase 200 mil contágios, 101.551 casos positivos, 75.945 curados e 27.967 mortos*, a Itália que já foi o epicentro da pandemia do novo coronavírus, luta diariamente contra o inimigo invisível que mudou completamente o hábito de 60,6 milhões de pessoas que vivem no país. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística Italiano (ISTAT), os estrangeiros representam 8,5% da população total na Itália, sendo 50,6 mil brasileiros residentes e, entre os quais, 35,2 mil são mulheres.
A Itália entrou em quarentena há quase dois meses. No dia 09 de março, o primeiro-ministro italiano Giuseppe Conte decretou o isolamento total, que incluiu a suspensão de aulas e de serviços não essenciais, o cancelamento de eventos e até mesmo a limitação de transportes de mercadorias. A Defesa Civil italiana confirmou que o confinamento será prorrogado até o dia 3 de maio, mas algumas atividades comerciais como papelarias, livrarias e lojas de roupas infantis já foram reabertas. Os italianos não podem sair de suas cidades de residência sem motivo válido, ou seja, é permitido sair de casa apenas para serviços essenciais e um membro por família, além de ser obrigatório ter em mãos o formulário oficial do governo denominado “auto-certificado” preenchido e assinado. As escolas de todos os níveis seguem ativas com aulas online e os bancos funcionam em turnos diferenciados.
O término da quarentena na Itália estava previsto, inicialmente, para o dia 13 de abril. Mas no domingo (26), Conte anunciou que, a partir do dia 04 de maio, o país entrará na fase dois do combate ao novo coronavírus. Nessa fase há uma espécie de convivência com a doença onde a população deverá manter as precauções e com isso seguir “mantendo a distância de segurança” de pelo menos um metro. Os aeroportos continuarão fechados e ainda não sem previsão de reabertura. A empresa aérea Alitalia tem previsão de voltar à normalidade parcial a partir de 1º de junho. Parques públicos serão reabertos e cerimônias funerárias permitidas com a presença de, no máximo, 15 pessoas, respeitando as regras de distância e todos de máscaras. Já os museus, as exposições e as bibliotecas serão reabertos a partir do dia 18 de maio, bem como o comércio varejista. A partir de 1º de junho, restaurantes, bares, clínicas de estética e cabeleireiros poderão retomar suas atividades.
Mesmo diante de um cenário delicado e da perspectiva de que mesmo a normalidade seja outra quando o pior passar, emergem do caos histórias de ressignificação, adaptação, força e coragem.
Nádia mora numa região onde estão registrados os maiores índices de infecção – Lombardia e Emilia-Romagna. 376.943 testes - 36.211 casos positivos - 13.772 mortos - 25.749 curados.
Nádia Santos: “Há um massacre de idosos”
Maranhense, nascida em Caxias, Nádia Santos é formada em Ciências Jurídicas, mora na cidade de Brescia, no norte da Itália, há mais de 30 anos, onde presta assessoria jurídica e atua no Conselho Cidadão dos Direitos Humanos que auxilia mulheres vítimas de violência doméstica na região. Ativista do Movimento Negro e dos direitos das mulheres é também mediadora intercultural em vários hospitais da cidade. “Desde que deixei o meu Maranhão e me mudei para a Itália sempre tive bem claro que eu queria era formar uma família, trabalhar e ajudar as pessoas com o meu saber jurídico. Fui conquistando tudo aos poucos com muita batalha”, conta a mãe de três filhos: Filipe, 26 anos, Iara, 19 anos e Michele, 15.
Em tempos de quarentena, Nádia se viu obrigada a mudar radicalmente seus hábitos laborais. Trocou os fóruns por conferências online, passou a atender seus clientes via aplicativos de vídeo e por telefone. Conta que o home-office por vezes é estressante porque é preciso ter disciplina e foco para atender clientes, filhos, namorado, animais de estimação. “O confinamento não é fácil para ninguém. Lidar com a pandemia e seus demônios e incertezas é uma tarefa hercúlea”, conta a maranhense que aprendeu a ficar em silêncio consigo mesma e a meditar para manter o equilíbrio. “Passei a praticar Yoga e Tai Chi Chuan – ensinamentos milenares de controle e relaxamento. Também passei a ler mais, ouvir mais música e assistir mais filmes”.
Nádia, que vive na cidade que já foi o epicentro do coronavírus na Itália, relata que as medidas de prevenção como o isolamento social, uso de máscara e luvas são obrigatórios e que os cidadãos seguem rigorosamente a lei, até porque as multas para os infratores são bem salgadas – de 200 a 3.000 euros. “A decisão do governo italiano de colocar a população em quarentena aconteceu tarde demais e hoje os reflexos estão aí para o mundo inteiro ver e aprender. O sistema hospitalar está saturado, faltam leitos, faltam respiradores e o resultado são milhares de mortos e uma tristeza sem fim. Há um massacre de idosos e também uma situação dramática para os profissionais da saúde. Já perdemos mais de 80 médicos e temos 10 mil operadores da saúde contaminados”, lamenta.
De acordo com um estudo publicado pelo Giornale di Brescia, na província lombarda a cifra de infectados seria 20 vezes maior que a oficial, cerca de 15% da população. E o mesmo com o número de mortes. A falta de testes – em vivos e mortos – torna impossível efetuar uma contagem confiável.
texto: Jornalista Gisele Figueiredo (do site Sul21)